Vejo Sylvain quase continuamente. Ele não desaparece quase nunca, as ondas não são mais muito profundas. De vez em quando, ele se vira e levanta o braço. Está sempre de peito nu, a toalha em cima da cabeça.
Não são mais ondas grandes, são pequenas ondas que nos levam para a costa. Existe uma espécie de barra onde elas chocam com um ruído espantoso; depois, vencida a barra cheia de espuma, afundam, atacando a floresta.
Estamos a menos de 1 quilômetro da costa. Percebo os pássaros brancos e rosados, com suas plumas aristocráticas, que passeiam ciscando na areia. São milhares… Quase nenhum deles voa a mais de 2 metros de altura. Estes pequenos vôos curtos são para não se molharem com a espuma. Há muita espuma e o mar está de um amarelo lamacento, nojento. Estamos tão perto, que enxergo nos troncos das árvores a linha suja que a água deixa na sua altura máxima.
O barulho das ondas não chega a cobrir os gritos agudos desses milhares de aves pernaltas de todas as cores. Pam! Pam! Mais 2 ou 3 metros. Pluft! Toquei o fundo, estou a seco, sobre a areia. Não há água suficiente para me levar. Pelo sol, são 2 horas da tarde. Há quarenta horas que parti. Foi anteontem, às 10 da noite, depois de duas horas de maré vazante. Portanto, é a sétima maré e é normal que eu esteja no seco: é a maré baixa. A maré alta vai começar lá pelas 3. De noite, vou estar no mato. Guardo a corrente, para não ser arrancado dos sacos, porque o momento mais difícil será aquele em que as ondas vão começar a passar em cima de mim, por falta de fundo, e vão me levar consigo. Não vou poder flutuar antes de pelo menos duas ou três horas de montante.
Sylvain está à minha direita, na frente, a mais de 100 metros. Olha para mim e faz uns gestos. Penso que ele quer gritar alguma coisa, mas sua garganta parece que não pode emitir som algum, senão eu ouviria. As ondas desapareceram, estamos em cima da areia, sem nenhum outro ruído para nos perturbar a não ser os gritos das aves pernaltas. Eu estou mais ou menos a 500 metros da floresta, e Sylvain a 100 ou 150 metros de mim, na minha frente. Mas o que é que está fazendo esta grande besta? Está de pé e abandonou a jangada. Está louco? Ele não pode andar, senão vai afundar um pouco a cada passo e talvez não consiga mais voltar até a jangada. Quero assobiar, não posso. Tenho ainda um pouco de água, esvazio a bolsa, depois tento gritar para ele parar. Não consigo emitir nenhum som. Da lama saem algumas bolhas de gás, é apenas uma crosta fina, embaixo está o lodo, e o sujeito que se deixar apanhar está mesmo frito.
Sylvain vira de novo para mim, me olha e faz sinais que não compreendo. Eu faço grandes gestos para ele, querendo dizer: não, não, não se mova da jangada, você nunca vai chegar até a floresta! Como está atrás dos seus sacos de cocos, não sei se está perto ou longe da jangada. No começo penso que deve estar bastante perto e que, no caso de afundar, ele pode se pendurar nela.
De repente, percebo que ele se afastou bastante e que está afundado na lama sem poder se desgrudar e voltar para a jangada. Um grito chega até onde estou. Então, deito-me de bruço sobre meus sacos e afundo as mãos na areia, puxando com todas as minhas forças. Os sacos avançam e eu chego a deslizar mais de 20 metros. É então que, andando em linha oblíqua à esquerda, quando me ponho de pé, vejo, sem ser mais atrapalhado pelos sacos, meu companheiro, meu amigo, enterrado até a barriga. Está a mais de 10 metros de sua jangada. O terror me devolve a voz e eu grito: “Sylvain! Sylvain! Não se mexa, deite na areia! Se puder, solte as pernas!” O vento leva as minhas palavras e ele as compreende. Abaixa e levanta a cabeça para dizer sim. Fico de novo de bruços e arranco a lama fazendo deslizar os sacos. A raiva me dá forças sobre-humanas e bastante rapidamente avanço na sua direção mais de 30 metros. Demorei mais de uma hora certamente, mas estou bastante perto dele, talvez a 50 ou 60 metros. Enxergo mal.
Sentado, com as mãos, os braços, o rosto cheio de lodo, tento enxugar o olho esquerdo, pois entrou lama salgada que arde e me impede de ver, não só desse olho, mas também do outro, do direito. Para ajudar, meu olho direito começa a chorar. Enfim, vejo-o; não está mais deitado, está de pé, só o seu peito se ergue acima da lama.
A primeira onda acaba de passar. Pulou por cima de mim, sem todavia me desgrudar, e foi se espalhar mais longe, cobrindo a areia com sua espuma. Passou também por cima de Sylvain, que está ainda com o peito de fora. Rapidamente penso: “Mais as ondas vão chegando, mais a lama vai ficar mole. Preciso chegar até ele, custe o que custar”.
Uma energia de animal que vai perder sua cria apodera-se de mim e, como uma mãe que quer arrancar seu filho do perigo iminente, puxo, puxo, puxo sobre esta lama para chegar até ele. Ele me olha sem uma palavra, sem um gesto, seus olhos grudados nos meus, que o devoram. Meus olhos cravados nele só se preocupam de não largar seu olhar e se desinteressam completamente de ver onde afundo as mãos. Arrasto-me um pouco, mas, por causa de duas outras ondas que passaram em cima de mim, cobrindo-me completamente, a areia ficou menos consistente e eu avanço muito menos rapidamente do que uma hora atrás. Uma onda enorme acaba de passar, quase me afogou e quase me desprendeu. Sento para ver melhor. Sylvain está na lama até as axilas. Estou a menos de 40 metros dele. Ele me olha intensamente. Percebo que ele sabe que vai morrer, afundado lá dentro, como um pobre imbecil, a 300 metros da terra prometida.
Torno a deitar e a arrancar esta lama que agora está quase líquida. Meus olhos e os seus estão fixos uns nos outros. Ele me faz sinal como para dizer que eu não insista, para não fazer mais esforços. Continuo, mesmo assim, e estou a menos de 30 metros quando chega uma onda grande que me cobre com sua massa de água e quase me arranca dos sacos, que, desprendendo-se, avançam 5 ou 6 metros.
Quando a onda passa, olho. Sylvain desapareceu. A lama, recoberta de uma leve camada de água espumosa, está completamente lisa. Nem mesmo a mão do meu pobre amigo aparece para me dar um último adeus. Minha reação é horrivelmente bestial, repugnante, o instinto de conservação acaba com qualquer sentimento: “Você está vivo. Você está sozinho e quando estiver no mato, sem amigo, não vai ser mole conseguir fugir”.
Uma onda que se quebra nas minhas costas, porque estou sentado, chama-me à ordem. Dobrou-me em dois e o golpe foi tão forte, que perco a respiração durante alguns minutos. A jangada desliza ainda alguns metros e somente então, olhando a onda morrer perto das árvores, choro Sylvain: “Estávamos tão perto! Se você não tivesse se movido… A menos de 300 metros das árvores! Por quê? Mas, me diga, por que você fez uma besteira dessa? Como você podia supor que essa crosta seca era bastante firme para permitir que você chegasse a pé até a costa? O sol? A reverberação? O que sei eu? Você não conseguia mais resistir a esse inferno? Diga-me por que um homem como você não conseguiu agüentar assar-se algumas horas mais?
As marolas se sucedem sem parar com um barulho de trovoada. Chegam cada vez mais próximas umas às outras e sempre maiores. Toda vez fico inteiramente coberto e toda vez deslizo mais alguns metros, sempre sobre a lama. Lá pelas 5 horas, as marolas se transformam de repente em ondas, eu desencalho e flutuo. As ondas, agora, quase não fazem barulho. A trovoada das marolas acabou. O saco de Sylvain já entrou no meio da vegetação.
Chego, não muito depressa, e sou depositado a apenas 20 metros da floresta virgem. Quando a onda se retira, estou de novo a seco, sobre a areia, e plenamente resolvido a não me mexer de meu saco até ter um galho ou um cipó nas mãos. Uns 20 metros. Levo mais de uma hora antes de chegar a um lugar bastante fundo e ser novamente levantado e levado para dentro do mato. A onda que me empurrou, rugindo, me jogou sobre as árvores. Solto o parafuso e me livro da corrente. Não vou jogá-la fora, pode ser que eu precise dela.