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Carbonieri é agora cozinheiro. O chefe do refeitório dos guardas lhe dá três coelhos para preparar para o dia seguinte, um domingo. Carbonieri manda, sem a pele felizmente, um coelho para o irmão, no cais, e dois para a gente. E então ele mata três grandes gatos e faz um guisado fantástico.

Infelizmente para ele, no dia seguinte, o médico é convidado para comer e, saboreando o coelho, diz:

– Senhor Filidori, dou-lhe os parabéns pelo cardápio, este gato é uma delícia.

– Não brinque comigo, doutor, estamos comendo três ótimos coelhos.

– Não – diz o médico, teimoso como uma mula. – São gatos. Está vendo as costelas que estou comendo? Elas são achatadas e as dos coelhos são redondas. Portanto, não há erro possível: estamos comendo gato.

– Virgem, mãe de Cristo! – diz o corso. – Estou com um gato na barriga.

E saí correndo para a cozinha, bota o revólver na cara de Matthieu e diz:

– Por mais que você seja napoleonista como eu, eu vou te matar porque você me fez comer um gato.

Tinha o olhar de um louco e Carbonieri, sem saber como a coisa viera à tona, responde:

– Se o senhor acha que aquilo que me deu é gato, não é culpa minha.

– Eu lhe dei coelhos.

– Então foram coelhos que eu cozinhei. Olhe, as peles e as cabeças ainda estão aqui.

Perplexo, o guarda olha para as peles e as cabeças dos coelhos.

– Então o médico não sabe o que diz?

– É o médico que está dizendo isso? – pergunta Carbonieri, aliviado. – Ele está brincando com o senhor. Diga que isso não é brincadeira que se faça.

Acalmado, convencido, Filidori volta para a sala de jantar e diz ao médico:

– Pode falar, pode falar quanto quiser, curandeiro. É o vinho que lhe subiu à cabeça. Achatadas ou redondas as suas costelas, eu sei que foi coelho que eu comi. Acabo de ver os três ternos deles e as três cabeças.

Matthieu tinha escapado por pouco. Mas ele achou melhor se demitir do cargo de cozinheiro alguns dias mais tarde.

Aproxima-se o dia em que vou poder agir. Mais algumas semanas e Barrot irá embora. Ontem fui visitar sua gorda esposa, que, diga-se de passagem, emagreceu muito graças ao regime de peixe cozido e verduras frescas. Essa mulher simpática me convida para entrar na casa dela e me oferece uma garrafa de vermute. Na sala há várias malas que estão arrumando. Estão preparando a viagem. A comandanta, como todo mundo a chama, me diz:

– Papillon, não sei como agradecer a sua gentileza comigo nesses últimos meses. Eu sei que, em alguns dias de pesca fraca, você me deu tudo o que conseguiu pescar. Agradeço muito. Graças a você, estou me sentindo muito melhor, emagreci 14 quilos. O que poderia fazer para retribuir?

– Uma coisa difícil para a senhora. Me conseguir uma boa bússola. Pequena, mas de precisão.

– O que você está pedindo Papillon, não é muita coisa e, ao mesmo tempo, é. E, em três semanas, isso vai ser muito difícil.

Oito dias antes da partida, esta nobre mulher, aborrecida por não ter conseguido uma boa bússola, teve a gentileza de tomar um barco costeiro e ir até Caiena. Quatro dias depois, ela voltava com uma magnífica bússola antimagnética.

O comandante e a comandanta Barrot saíram hoje pela manhã. Ontem, ele entregou o comando a um oficial da mesma patente dele, da Tunísia, chamado Prouillet. Boa notícia: o novo comandante manteve Dega no seu cargo de contador geral. É muito importante para todo mundo, principalmente para mim. No discurso que fez para os forçados reunidos em formação no pátio grande, o novo comandante deu a impressão de ser um homem muito enérgico, mas inteligente. Entre outras coisas, ele disse:

– A partir de hoje, assumo o comando das Ilhas da Salvação. Depois de ter verificado que os métodos do meu predecessor tiveram resultados positivos, não vejo motivos para alterar o que existe. Se, pelo seu comportamento, vocês não me obrigarem a isso, não vejo razão para modificar o seu modo de viver.

Foi com uma alegria bem justificada que vi partirem a comandanta e seu marido, embora estes cinco meses de espera forçada tenham passado com uma rapidez incrível. Esta falsa liberdade de que gozam quase todos os forçados das ilhas, os jogos, a pesca, as conversas, as novas relações, as discussões, as brigas são derivativos poderosos e a gente não tem tempo para se aborrecer.

Mas não me deixei realmente envolver por este ambiente. Toda vez que adquiria um novo amigo, eu me fazia a seguinte pergunta: “É candidato à fuga? Poderia ajudar um outro a preparar uma evasão, se ele mesmo não quiser partir?”

Vivo só para isto: fugir, fugir, sozinho ou acompanhado, mas fugir. É uma idéia fixa, da qual não falo com ninguém, conforme o conselho de Jean Castelli, que sigo à risca, E, sem fraquejar, cumprirei o meu ideal: fugir.

7 AS ILHAS DA SALVAÇÃO (continuação)

UMA JANGADA DENTRO DE UM TÚMULO

Com cinco meses, já cheguei a conhecer mesmo os menores recantos da ilha. E agora estou convencido de que o jardim junto ao cemitério onde trabalhava meu amigo Carbonieri – agora, ele não está mais lá – é o ponto mais seguro para preparar uma jangada. Então peço a Carbonieri que volte ao trabalho do jardim, sem ajudante. Ele concorda. Graças a Dega, confiam-lhe outra vez o jardim.

Hoje de manhã, quando passo em frente à casa do novo comandante, com uma enfiada de pescados num arame, ouço um jovem forçado, moço de serviços, dizer à mulher dele, ainda moça:

– É este aqui, senhora comandanta, que trazia peixe todo dia Para a Sra. Barrot.

E ouço a bonita morena, de tipo argelino, pele bronzeada, responder:

– Então, o Papillon é ele? Ela se vira para mim e diz:

– Comi as lagostas deliciosas que você pescou, foi a Sra. Barrot que me deu. Entre aqui em casa. Aceite um copo de vinho e um pouco de queijo de cabra, que eu recebi há pouco tempo da França.

– Não, obrigado, minha senhora.

– Por quê? Quando era a Sra. Barrot, você entrava; por que, agora que sou eu, você não quer entrar?

– É que o marido dela tinha dado autorização para eu entrar.

– Papillon, meu marido é comandante no campo, na casa quem manda sou eu. Pode entrar sem medo.

Percebo que aquela morena bonita, tão decidida, pode ser ou útil ou perigosa. Entro.

Na mesa da sala de jantar, ela me serve um prato de presunto defumado com queijo. Sem fazer cerimônia, ela se senta à minha frente, me oferece vinho, depois café e um delicioso rum da Jamaica.

– Papillon – me diz ela -, apesar dos rebuliços da mudança dela e da nossa chegada, a Sra. Barrot teve tempo de me falar de você. Sei que ela era a única mulher das ilhas que ganhava peixe de você. Espero que você me faça a mesma gentileza.

– É que ela estava doente, mas a senhora está com boa saúde, pelo que vejo.

– Não sei mentir, Papillon. É verdade, tenho boa saúde, mas vim de uma cidade de porto e adoro peixe. Eu sou de Oran. Mas fico sem jeito porque sei também que você não vende seu peixe. E isso é pena.

Em suma, ficou entendido que eu traria peixe para ela.

Eu estava fumando um cigarro, depois de dar a ela 3 bons quilos de salmonetes e seis lagostins, quando chega o comandante. Ele me vê e diz:

– Já disse, Juliette, que, fora o moço de serviços, nenhum preso pode entrar aqui em casa.

Levanto, mas ela diz:

– Fique sentado. Este preso é o homem que a Sra. Barrot me recomendou quando foi embora. Portanto, você não tem nada a objetar. Ninguém mais além dele vai entrar aqui. Por outro lado, ele vai me trazer peixe quando eu precisar.

– Está bem – diz o comandante. – Como é que você se chama?

Vou me levantando para falar com ele, mas Juliette põe a mão no meu ombro e me faz sentar outra vez:

– Aqui – diz ela – é a minha casa. O comandante não é mais o comandante, é meu marido, o Sr. Prouillet.

– Obrigado, minha senhora. Meu nome é Papillon.