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– Dez mil pesos para o senhor, se mandar me hospitalizar.

– Francês, vou tentar. Não tanto pelos 10 000 pesos, mas porque dá pena ver você lutar tanto e em vão por sua liberdade. Só que não creio que mantenham você no hospital, por causa do artigo no jornal. Vão ficar com medo.

Uma hora depois, o médico me manda para o hospital. Aí, nem mesmo toquei o chão. Descido de padiola da ambulância, voltei à prisão duas horas depois, após uma observação clínica minuciosa e um exame de urina, sem ter me mexido da padiola.

Estamos a 19, uma quinta-feira. A mulher de Joseph, Annie, veio acompanhada pela mulher de um corso. Elas me trouxeram cigarros e alguns doces. Com suas palavras afetuosas, essas duas mulheres me fizeram um bem imenso. As mais belas coisas, a manifestação da sua pura amizade, verdadeiramente transformaram este dia “amargo” numa bela tarde ensolarada. Não serei capaz de exprimir jamais o quanto a solidariedade do pessoal da “zona” me fez bem, durante minha permanência na prisão 80. Nem quanto devo a Joseph Dega, que chegou a arriscar sua liberdade e sua situação para me ajudar a fugir.

Mas uma palavra de Annie me deu uma idéia. Conversando, ela me diz:

– Meu querido Papillon, você fez tudo o que era humanamente possível para tentar recuperar a liberdade. O destino foi cruel; só lhe falta mesmo explodir a 80!

– E por que não? Por que não mandaria pelos ares esta velha prisão? Prestaria um serviço a estes colombianos. Se eu fizer explodir a prisão, talvez resolvam construir uma nova, mais higiênica.

Ao abraçar estas encantadoras jovens, de quem me despeço para sempre, digo a Annie:

– Diga a Joseph para me ver no domingo.

No domingo, dia 22, Joseph aparece.

– Escute, faça o impossível para que alguém me traga, na quinta uma banana de dinamite, um detonador e um fio Bickford. De minha parte, vou fazer o necessário para ter uma broca e três mechas de tijolo.

– Que é que vai fazer?

– Vou explodir o muro da prisão em plena luz do dia. Prometa 5 000 pesos ao táxi falso. Que esteja na rua atrás da Rua Medellin todos os dias, de 8 horas da manhã às 6 da tarde. Receberá 500 pesos por dia, se não acontecer nada, e 5 000 pesos, se acontecer alguma coisa. Pelo buraco que a dinamite vai abrir, chegarei, carregado por um colombiano forçudo, até o táxi; ao chofer cabe o resto. Se o táxi falso aceitar, mande a dinamite. Sc não, então é o fim, não há mais esperança.

– Conte comigo – diz Joseph.

Às 5 horas faço com que me carreguem nos braços para a capela. Digo que quero rezar sozinho. Sou carregado para lá. Peço que Don Gregorio venha me ver. Ele vem.

– Hombre, só tem oito dias para você se despedir de mim.

– Foi por isso que pedi que o senhor viesse. O senhor tem 15 000 pesos, que me pertencem. Quero entregá-los ao meu amigo, antes de partir, para que os mande à minha família. Queira aceitar 3 000 pesos, que lhe ofereço de todo coração, por ter-me sempre protegido da brutalidade dos soldados. O senhor me faria um favor se me desse o dinheiro hoje, com um rolo de papel colante, para que, de hoje até quinta-feira, eu arrume os pesos para entregar ao meu amigo.

– Combinado.

Ele volta e me entrega, sempre cortados em dois, 12 000 pesos. Guarda consigo 3 000.

Regressando ao meu carrinho, chamo ao meu canto solitário o colombiano, aquele que foi comigo da última vez. Conto a ele meu projeto e lhe pergunto se é capaz de me carregar nos braços, por uns 20 ou 30 metros, até o táxi. Ele se compromete formalmente. Estou agindo como se Joseph fosse conseguir as coisas. Segunda-feira, de manhãzinha, vou para o banheiro e Maturette, que, com Clousiot, funciona sempre como “chofer” do meu carrinho, vai à procura do sargento, a quem dei 3 000 pesos e que tão barbaramente me espancou, por ocasião da última tentativa de evasão.

– Sargento López, preciso lhe falar.

– Que é que o senhor quer?

– Pago 2 000 pesos por uma broca muito forte com três velocidades e seis mechas de tijolo. Duas de meio centímetro, duas de 1 centímetro e duas de 2 centímetros e meio de grossura.

– Não tenho dinheiro para comprar isso.

– Tome aí 500 pesos.

– Amanhã, terça-feira, na mudança da guarda, à 1 hora, eu lhe passo a muamba. Prepare os 2 000 pesos.

Na terça-feira recebo tudo à 1 hora, na lata de lixo vazia do pátio, uma lata de papéis que é esvaziada na mudança da guarda. Pablo, o colombiano-fortão, junta tudo e esconde.

Na quinta-feira, 26, por ocasião da visita, nada de Joseph. Lá pelo fim da visita, sou chamado. É um velho francês, todo enrugado, que vem da parte de Joseph.

– Neste pão está tudo que pediu.

– Aqui estão 2 000 pesos para o táxi. Cada dia, 500 pesos.

– O chofer do táxi é um velho peruano machão. Por este lado, fique descansado. Tchau.

– Tchau.

Num grande saco de papel, para que o pão não desperte curiosidade, botaram cigarros, fósforos, salsichas defumadas, um salsichão, um pacote de manteiga e um frasco de azeite escuro. Enquanto faz a revista do meu embrulho, dou ao guarda da porta um maço de cigarros, fósforos e duas salsichas. Ele me diz:

– Me dá um pedaço de pão.

Só faltava esta!

– Não, o pão você compra. Tome 5 pesos, porque o pão não é suficiente para nós seis.

Ufa! Escapei por um triz. Mas que idéia de oferecer salsichas a este cara! O carrinho se afasta depressa deste policiai chato. Fiquei tão surpreendido com o pedido de pão, que ainda estou todo suado.

– É amanhã o foguetório. Tudo está aí, Pablo. É preciso fazer o buraco exatamente debaixo da saliência da torrezinha. O meganha ali de cima não vai poder ver você.

– Mas ele pode ouvir.

– Já previ isso. De manhã, às 10 horas, este lado do pátio está na sombra. É preciso que um dos trabalhadores que lidam com cobre se ponha a aplainar uma folha de cobre, chapeando na parede, a alguns metros de nós, a descoberto. Se forem dois, ainda melhor. Dou a cada um deles 500 pesos. Encontre os dois homens.

Ele os encontra.

– Dois amigos meus vão martelar o cobre sem parar. A sentinela não poderá notar o ruído da mecha. Só que é preciso que você, com seu carrinho, fique um pouco de fora da saliência e que arranje um bate-boca com os franceses. Isso me deixará um pouco encoberto para a sentinela da outra esquina.

Em uma hora, está perfurado o buraco. Graças às marteladas no cobre e graças ao azeite, que ajuda a penetração da mecha, a sentinela não percebe nada. A banana de dinamite é colocada dentro do buraco, o detonador fixado, 20 centímetros de mecha. A banana é calçada com barro. A gente dá o fora. Se tudo correr bem, um buraco se abrirá com a explosão. O soldado de sentinela cairá com a guarita e eu, através do buraco, carregado por Pablo, chegarei ao táxi. Os outros se arrumarão. Logicamente, Clousiot e Maturette, mesmo saindo depois de nós, chegarão ao táxi mais depressa do que eu.

Exatamente antes de tocar fogo, Pablo avisa um grupo de colombianos.

– Se vocês quiserem fugir da prisão, dentro de alguns instantes vai ter um buraco no muro.

– É bom correr, porque os policiais vão atirar nos últimos, que estiverem mais à vista.

A gente toca fogo. Uma explosão infernal estremece o quarteirão. A torrezinha se despencou com o policial. O muro tem grossas rachas por todos os lados, tão largas que dá para ver a rua do outro lado, mas nenhuma dessas aberturas tem largura suficiente para que se possa passar por ela. A explosão não produziu nenhuma brecha suficiente e é só neste momento que admito que estou perdido. Meu destino é mesmo o de voltar para lá, para Caiena.

O bafafá que se segue à explosão é indescritível. Há mais de cinqüenta policiais no pátio. Don Gregorio sabe com quem tem a ver.

– Bueno, francês. Desta vez, penso que é a última.

O chefe da guarnição está louco de raiva. Não pode dar a ordem de espancar um homem ferido, deitado num carrinho, e eu, para evitar aborrecimentos aos outros, declaro bem alto que fui eu mesmo quem fiz tudo sozinho. Seis guardas na frente do muro rachado, seis no pátio da prisão, seis na rua, do lado de fora, ficarão de guarda permanente até que os pedreiros tenham feito os reparos. A sentinela, que caiu do muro de ronda, não sofreu nada, por sorte.